É triste quando enfrentamos situações as quais não sabemos como lidar. E mais triste ainda quando essas situações colocam em risco a integridade de outras pessoas.
Essa semana ocorreu algo que demonstrou a fraqueza, que por muitos é considerada incompetência, dos nossos órgãos de defesa.
Não vejo dessa forma. Incompetência é algo muito forte para ser atribuído a pessoas que se esforçaram e se sacrificaram demais para manter íntegros todos os envolvidos no caso, repito, todos!
Seria incompetência não lembrar que havia milhares de câmeras filmando todos os passos que estavam sendo dados e não cortar o sinal do televisor o qual o individuo acabava utilizando como câmeras de sua própria segurança?
Pois é, a ação da polícia no caso foi, como citada pelo comandante da operação, praticamente perfeita. Após cinco dias de negociações, os números são realmente incríveis. Apenas uma morte dentre três possíveis. Infelizmente a pessoa que veio a falecer era uma das vítimas, “pois a nossa ética policial nos impede de atirar em qualquer infrator se ele não estiver com a arma em punhos ameaçando qualquer pessoa, pois assim não podemos alegar legítima defesa” (palavras de um senhor aposentado da polícia de São Paulo em entrevista a Ana Maria Braga em seu programa na Rede Globo no dia 20 de Outubro).
Interpretando o que esse senhor disse: para podermos sair vivos de um momento delicado como esse, o tal delinqüente tem que estar apontando a arma para nós. E se por acaso essa arma vem a disparar, o delinqüente fica vivo e quem estava sob a mira da arma em momento delicado morre? Interessante essa interpretação.
E quanto à “operação ser praticamente perfeita, e só estarmos discutindo tanto sobre esse assunto porque uma das vítimas veio a falecer, e que se o infrator fosse o morto nós também estaríamos fazendo comentários a respeito da ação da policia”, bom, fica claro o despreparo emocional desse senhor que assim falou em rede nacional.
Como uma operação pode ser praticamente perfeita quando a vítima tem apenas quinze anos e foi assassinada friamente por uma pessoa perturbada mentalmente pelo término de um relacionamento entre adolescentes?
Então o “praticamente” está ligado à possibilidade de termos duas vítimas fatais, porém a polícia conseguiu salvar uma. Ou seja, cinqüenta por cento das vítimas sobreviveram, isso deixa a operação praticamente perfeita.
Vamos lá, situações imperfeitas em uma operação praticamente perfeita. Após isso verificaremos o tamanho da perfeição dessa ação policial.
1º: O básico, como um adolescente consegue uma arma tão facilmente nesse país?
2º: Como um menino que visivelmente tem problemas psicológicos graves é colocado para negociar qualquer coisa com um policial, depois com um promotor, com um advogado, opa! Porque tanta gente? Não deveria ser apenas um negociador? Enfim, concluo que o houve uma falha gravíssima nesse ponto, e não preciso ser perito para falar isso.
3º: Como, após o sucesso de uma negociação entre uma refém e o restabelecimento da energia elétrica, a polícia deixa uma menina de quinze anos tentar ajudar nas negociações e voltar ao apartamento? Espera um pouco, mais uma negociante? Eu iria ficar confuso no lugar do meliante, e confusão não iria me fazer nada bem em um momento depressivo.
4º: Se existiam empresas de televisão divulgando a todo instante o que estava acontecendo no local, entrevistando policiais sobre quais as atitudes seriam tomadas, não deveria ter sido cortado qualquer tipo de contato televiso da casa? Ou vocês pensam que eles estavam todos na sala reunidos assistindo “Malhação”? Essas informações que vinham pela televisão não o fizeram em momento nenhum montar uma proteção atrás da porta, já que no momento em que a menina voltou ao apartamento não houve demora nenhuma em abrir a porta e depois em fechá-la.
5º: Bom, fica claro que, pelo menos para leigos como eu, a polícia desconhecia qualquer tipo de objetos que existiam no apartamento. Será que houve uma consulta para saber se haveria a possibilidade de que com algum móvel o delinqüente poderia tentar dificultar a entrada dos policiais no apartamento? E porque depois de cinco dias de negociação não esperar e tentar negociar mais um pouco? Ficou evidente nas entrevistas passadas em todas as redes de televisão que cobriram o fato e no depoimento do jovem que não havia tido nenhum disparo de arma de fogo até a tentativa frustrada da polícia em entrar no apartamento. Mais frustrante ainda para nós, é o depoimento dos policiais de que haviam escutado tiros dentro do apartamento. Será que não ouviram o barulho da televisão? Incrível também a sincronia do policial que subiu pela escada, pois se os que tentaram entrar pela porta demoraram, o que tentou entrar pela janela levou no mínimo dois minutos a mais, e o mais interessante, quase caiu da janela reparando bem na imagem.
6º: Após a entrada no apartamento, fica claro com as diversas tentativas de seis policiais em conter um jovem que a operação foi praticamente perfeita.
Bom, não sou perito, não sou policial, não sou técnico em estratégias de como lidar com situações desse tipo, sou apenas um cidadão me colocando no lugar de todos os que acompanharam o acontecido.
Indigna a ação da polícia de São Paulo, pois não me pareceu ser uma operação de um grupo tão qualificado como insistem em exaltar.
Indignação é o sentimento de todos que acompanharam diariamente essa trágica história e não é diferente do meu sentimento.
Flávio Nery
20/10/2008.
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